Jorge Moreira da Silva é um daqueles políticos que nos fazem acreditar na política, tem um percurso consistente, nunca optou pelo caminho mais fácil, nunca cedeu à tentação dos discursos mais ou menos populistas, mesmo em funções como vice-presidente do PSD, e isso explicará, pelo menos parcialmente, a sua dificuldade de afirmação partidária. Mas é por isso mesmo que poderia e deveria ter escolhido outra iniciativa política para mostrar que existe como ministro do Ambiente e Energia.
O ministro que esteve desaparecido durante o Verão dos incêndios decidiu mostrar publicamente a sua força e chamar ao ministério os responsáveis da China Three Gorges (CTG), os chineses accionistas da EDP, porque estariam a violar um compromisso assumido com o Estado português quando compraram a maioria do capital da eléctrica, isto é, a construção de uma fábrica de turbinas eólicas em Portugal.
Faço, desde já, uma declaração de interesses: estou a escrever este texto a partir de um hotel em Pequim, a acompanhar uma visita de mais de trinta empresas fornecedoras da EDP que realizam, esta semana, um road-show à capital do império do Oriente. A maior visita empresarial privada, diga-se de passagem.
A notícia de que a CTG não construiria essa fábrica não é nova, foi 'apenas' oficializada, e noticiada. Não a torna menos relevante, mas já estava pré-anunciada e o Governo - este, que vendeu a EDP - sabia-o. E sabia que esse compromisso estava no plano de intenções, não era um compromisso firme, como foram outras condições do negócio. No plano de intenções não estava, por exemplo, a entrada de um banco chinês em Portugal, mas isso já aconteceu, o Bank of China abriu uma agência por causa da CTG.
Jorge Moreira da Silva chamou os gestores da CTG para pedir explicações que já deveria ter e que, se não tinha, deveria tê-las pedido em privado. Ao pedir essas explicações da forma que o fez, denuncia as suas intenções. O Estado já não tem acções da EDP, mas, como se vê, a tentação de fazer, e misturar, política com os negócios não se perdeu.
O Governo deve ser exigente em relação aos negócios que faz, e cobrar os compromissos, mas Jorge Moreira da Silva decidiu apresentar trabalho, da pior forma, e ironicamente, na mesma semana em que a CTG contribuiu para a internacionalização de empresas portuguesas num mercado como o chinês. Os chineses são institucionais, darão todas as respostas que o ministro pedir, aceitarão todos os 'convites' de Jorge Moreira da Silva. Mas não esquecem. Porque, é bom lembrar, pagaram caro pela EDP, como se constata da actual cotação da empresa face à privatização. E porque, à sua conta, precisamente porque são chineses, porque têm, é certo, interesse em manter uma EDP de base nacional, a eléctrica nacional expande-se e acede a financiamento que, de outra forma, teria muita dificuldade em garantir.
Jorge Moreira da Silva fica, a partir de agora, com outra responsabilidade. O ministro tem de explicar, afinal, quais foram as explicações da CTG para não ter concretizado esse investimento e quais as consequências que quer retirar dessas avaliações. Vai ver-se chinês
PS: O Diário Económico inicia hoje a publicação de um conjunto de trabalhos sobre a Alemanha e as relações com Portugal, a propósito das eleições legislativas daquele país no próximo dia 22. Serão, seguramente, mais relevantes para o futuro económico e financeiro de Portugal do que as autárquicas de 29 de Setembro, também por responsabilidade dos partidos do arco de poder que optaram, deliberadamente, por descredibilizar um acto eleitoral local cujos resultados são muito relevantes no dia-a-dia dos cidadãos.